Arthur Russell foi um compositor, produtor, violoncelista e cantor norte-americano de Iowa, com obra que abrangeu uma vasta gama de estilos. Especializado em composição experimental contemporânea, a partir dos anos 1970 relacionou-se com músicos dos circuitos avant-garde de Nova Iorque, assim como com a sua comunidade disco.

Arthur Russell

Os sonhos do menino de Iowa

A música do visionário Arthur Russell (1951-1992), referenciado e citado por inúmeros músicos dos nossos dias, está agora à disposição de qualquer curioso nos arquivos da Biblioteca de Artes Performativas do Lincoln Center, em Nova Iorque (Estados Unidos da América). Como nunca acontecera antes, o seu nome tornou-se já numa referência maior de um estilo terno e sensível. Graças à parceria de Arthur Russell e Tom Lee e, recentemente, a Steve Knutson, da editora Audika Records, o mundo pode escutar muitas canções não conhecidas, recuperadas de diversos registos guardados no seu vasto arquivo de obras inéditas e inacabadas. Nesta coleção de inéditos, de título “Iowa Dream”, descobre-se o menino de Iowa, aquele que era devoto da música disco, o cantor e escritor de canções, o compositor e o feroz perfecionista mergulhado no mundo do eco.

No entanto, ainda que todas essas características do músico sejam isoladamente verdadeiras, nenhuma só por si o define…

Arthur Russell criou e Peter Broderick restaurou e revelou

Aqui chegados, após dez anos de trabalho com o material legado por Artur Russell, Tom e Steve apresentam-nos “Iowa Dream”, uma nova estrela a juntar-se à deslumbrante constelação deixada pelo músico. Estas dezanove canções são uma impressionante coleção de composições totalmente distintas das suas canções já conhecidas. É um fulgor novo, com uma sensibilidade bem definida. E ainda que Arthur Russell pudesse ser imcompreensívelmente obstinado, ele nunca foi um homem isolado. Nestas obras colaborou um vasto número de músicos da chamada downtown scene de Nova Iorque, incluindo-se entre eles Ernie Brooks, Rhys Chatham, Henry Flynt, Jon Gibson, Peter Gordon, Steven Hall, Jackson Mac Low, Larry Saltzman e David Van Tieghem.

Para além desses também Peter Broderick, músico que acrescenta uma sensibilidade ainda mais contemporânea à dos referidos, que laborou diligentemente com a editora Audika Records as canções quase acabadas ao longo de mais de quarenta anos da intensa criatividade de Arthur Russell, completando e regravando muitas delas e acrescentando, quando necessário, o adequado restauro áudio e uma nova mistura, para poderem ser de novo escutadas.

Um disco caleidoscópico e íntimo

Em “Iowa Dream” há várias peças que foram originalmente gravadas como demos, nomeadamente uma de 1974, com Paul Nelson, da Mercury Records, e outra de 1975, com o lendário John Hammond, da Columbia Records. Por diferentes razões, nenhuma destas sessões foi contemplada com um contrato de gravação, mas Arthur Russell continuou a trabalhá-las até 1992, já perto da sua morte por complicações com VIH/SIDA.

Simultaneamente caleidoscópico e íntimo, o álbum “Iowa Dream” contém alguns dos trabalhos mais pessoais de Arthur Russell, incluindo canções folk que escreveu no início dos anos 1970, durante a sua passagem pela Califórnia. Apesar das distâncias, Iowa nunca esteve longe de mais: “I See, I See It All”, canta ele na canção com esse título, recordando casas vermelhas, campos, o mayor da cidade (que era o seu pai), fluindo enquanto sonha com bicicletas atravessando a cidade natal. Depois, a casa da infância de Arthur Russell e o eco da família, através de “Just Regular People”, “I Wish I Had A Brother”, “Wonder Boy”, “The Dogs Outside Are Barking”, “Sharper Eyes” e “I Felt”. Canções como “I Kissed The Girl From Outer Space”, “I Still Love You”, “List Of Boys” e “Barefoot In New York” fervilham em apelos pop e de dança, assinalando a devoção de Arthur Russell à avant-garde e à cultura disco de Nova Iorque. Por fim, o tão aguardado “You Did It Yourself” – até agora escutado apenas ilustrando um breve apontamento a preto e branco do documentário de Matt Wolf, “Wild Combination: A Portrait Of Arthur Russell” – apresenta-se aqui numa nova versão com um ritmo funk bem definido e a característica e extraordinária voz de Arthur Russell vibrando em todo o seu esplendor.

No álbum “Iowa Dream” ouvimos aquele rapaz do campo, que vai descobrindo o resto do mundo. Com este disco, o resto do mundo também aprofunda o seu conhecimento sobre um artista absolutamente excecional.

Texto e imagem © Audika Records
Tradução e adaptação CC BY 4.0 // Luís Freixo

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