Com a chegada da primavera chegam a Portugal Owen Pallett (também conhecido como Final Fantasy) e The Hidden Cameras, que celebram em simultâneo duas propostas musicais diferentes, com duas décadas de existência, numa digressão conjunta pela Europa fora.
Owen Pallett, o rapaz do violino
Michael James Owen Pallett (na foto), nascido em 1979, é um violinista, teclista e vocalista canadiano que também integrou The Hidden Cameras na sua fase inicial, de 2001 a 2003, participando nos dois primeiros álbuns dessa banda comunitária de Toronto, “Ecce Homo” e “The Smell Of Our Own”. No violino ele é um virtuoso, mas não da forma mais clássica ou erudita. Bem pelo contrário, os seus discos evidenciam as influências do rock, da música pop e da eletrónica.
Quando deixou The Hidden Cameras passou a assinar como Final Fantasy e, assim, editou três álbuns: “Has A Good Home” (2005), “He Poos Clouds” (2006), trabalho composto para quarteto de cordas e inspirado no jogo “Dungeons & Dragons” e, depois, ainda “Heartland” (2010), álbum conceptual inspirado num mundo fantástico que, devido ao impedimento legal pela Disney do uso do pseudónimo do artista, é de novo lançado já sob o seu próprio nome.
Depois disso assinou com William Butler (multi-instrumentista e irmão do vocalista dos Arcade Fire) a banda sonora para o filme “Her” (2013) de Spike Jonze, com os atores Joaquin Phoenix e Scarlett Johansson, mas o disco só seria lançado oito anos depois. Já no ano seguinte (2014) apresentou o elaborado “In Conflict”, álbum em seu nome, mas com parcerias tão inigualáveis quanto a de Brian Eno (sintetizadores, guitarra e vozes), que mereceu os maiores elogios da crítica. Em 2020 tem mais uma banda-sonora editada, a de “Spaceship Earth”, e o novo álbum “Island”, que a estação de rádio NPR Music descreveu como “ópera cósmica e celestial”.
Para além de tudo isto, Owen Pallett colaborou enquanto músico, arranjador ou produtor com muitos grupos e artistas, como os Arcade Fire, Grizzly Bear, Beirut, Pet Shop Boys, Mika, Duran Duran, The National, R.E.M., Franz Ferdinand, Caribou, Charlotte Gainsbourg, Keane, Xiu Xiu, Lana Del Rey e bastantes mais.
Pallett nasceu em Mississauga, Ontário, e cresceu em Milton. Em 2002 recebeu o Honours Bachelor of Music for Composition da Universidade de Toronto. Pallett é homossexual, identifica-se como gay e usa pronomes neutros de género. O seu álbum favorito é “A Promise”, dos Xiu Xiu.
The Hidden Cameras, o grupo de Joel Gibb
The Hidden Cameras é um grupo de Toronto, como já se disse, e liderado por Joel Gibb, nascido em 1977. O seu primeiro envolvimento com a música independente deveu-se à colaboração no fanzine Glamour Guide For Trash. Em 2001 reuniu umas quantas canções da sua autoria, assinadas como The Hidden Cameras, e no ano seguinte é lançado o seu primeiro álbum, “Ecce Homo” (2002), totalmente da sua autoria e gravado num simples 4 pistas. É com este álbum já editado que ele vai reunir à sua volta um coletivo de músicos, incluindo Owen Pallett, que o acompanharão em apresentações ao vivo e em futuros trabalhos.
Um ano depois surge “The Smell Of Our Own” (2003), confirmando a sua liderança de um coletivo amplo e versátil. Gibb é um ativista LGBT+ e a música do seu grupo inscreve-se num género dito “gay church folk music”, sendo irreverente e aberta a influências da folk, do rock’n’roll e da música eletrónica. Em palco costumam ser numerosos e hiperativos, com o vocalista e puxar pelo resto da banda, geralmente com dançarinos go-go vestindo gorros balaclava (que tapam toda a cabeça do performer, exceto os seus olhos), com vastos coros e quartetos de cordas. Mas, se assim convém, como agora, também se apresentam numa variação a solo, como banda de um homem só, o músico que esteve na sua origem, interpretando as canções do seu grupo em versões simplificadas para voz, guitarra e bateria.
Muitos outros álbuns se seguiram a este, que está a completar 20 anos de existência: “Mississauga Goddam” (2004), “Awoo” (2006), “Origin:Orphan” (2009), “Hidrogenesse Vs. The Hidden Cameras” (2010), “Age” (2014) e “Home On Native Land” (2016). Numa digressão europeia, que passa por várias localidades em Portugal, com Owen Pallett ao seu lado, Joel Gibb mostra ao vivo as suas versões do álbum “The Smell Of Our Own”, mas também alguns temas inéditos do próximo longa-duração, previsto para 2024.
Se Gibb se pode tornar relevante como compositor, intérprete e ativista, ele também tem sido notado e apreciado como desenhador, designer e videoartista, participando em mostras coletivas, inclusive na britânica Tate Modern e na norte-americana Sunday L.E.S. (agora Horton Gallery). Atualmente vive em Berlim (Alemanha).
A fantasia final
Apesar de Pallett e Gibb terem hoje dois projetos bem distintos, por vezes torna-se difícil para eles separar as águas e esquecer o caminho que fizeram juntos no início das suas carreiras. Em palco, Gibb mostra-se a solo pela primeira vez em Portugal, embora conte com a proximidade do seu velho amigo e colega Pallett, que também recordará os seus dois primeiros álbuns assinados ainda como Final Fantasy, aproveitando a sua recente reedição.
Uma cumplicidade que vence as atuais distâncias geográficas e que flui para nós, atentos e eleitos, como música viva, bem-vinda e vibrante. Da primeira à última fantasia!
Texto CC BY 4.0 // Luís Freixo
Imagem CC BY-NC 2.0 // jellybeanz
